Foi a privatização quem popularizou os celulares?

18 novembro 2010

A gigantesca expansão do número de telefones celulares no Brasil é um dado muito positivo. Ainda que, sociologicamente, várias questões controversas possam ser colocadas a esse crescimento, fato é que o celular está mais do que popularizado, o que facilita a comunicação e reduz, nesse aspecto, a capitalisticamente intransponível barreira entre as classes.
Como aconteceu com os rádios, as televisões e, aos poucos, vai acontecendo com os computadores, essa popularização tem quase tudo a ver com dois fatores: aumento do poder aquisitivo das classes mais baixas e, especialmente, expansão tecnológica. Porém, no caso da telefonia, parte da mídia brasileira, em defesa de políticas neoliberais, insiste em usar a questão da telefonia como exemplo de como a política de privatizações traria bons resultados para todos.

Esse é o caso de reportagem de dois minutos veiculada nesta quinta-feira no Jornal Nacional. A ode à privatização é a tônica da matéria, que trata originalmente do dado que aponta mais celulares do que pessoas no Brasil. Já são mais de 194 milhões de aparelhos no país.

A repórter Delis Ortiz tenta fazer da popularização do aparelho uma causa ganha pela privatização. Seu texto diz: “Em 90, quando chegou ao Brasil, era privilégio de poucos. Mas isso virou museu, passado. Depois da privatização do setor, em 1998, o número de linhas de telefones móveis saltou (…)”. Ou seja: para ela, a privatização ajudou o povo. O gráfico que a própria matéria apresenta, porém, mostra que o crescimento foi gradual, não foi de uma hora para outra, com a privatização, que o celular ganhou as ruas.
Tem mais: “Um setor totalmente privatizado, e sujeito à concorrência. O consumidor saiu ganhando”, diz a repórter, antes de Evilene Souza, empregada doméstica, complementar: “antes a gente mais simples não podia ter um aparelho telefônico, só quem tinha condição, que era rico. Hoje em dia o pobre pode ter”.
Não posso acreditar que a entrevistada tenha sido perguntada sobre a privatização do setor de telefonias. Foi perguntada, imagino, sobre a melhora no serviço de celular e a popularização dos aparelhos, e deu a resposta óbvia. Mas, com a edição da matéria, parece que a resposta realmente complementa o texto de Delis, corroborando a tese de que é a privatização a responsável pela melhoria inegável.
Apenas com um minuto e meio de uma matéria de dois minutos aparece, rapidamente, uma declaração de Ronaldo Sardenberg, presidente da Anatel, que afirma que o aumento do poder aquisitivo “foi fundamental para a multiplicação dos celulares do país”. Eduardo Levy, diretor-executivo da SinditeleBrasil, é a única fonte especializada entrevista na reportagem, além do presidente da Anatel. E também não fala na privatização como determinante, assim como as pessoas entrevistadas nas ruas. Absolutamente nenhuma fonte cita esse fator. Apenas a repórter o faz, mais uma demonstração de que a pauta já estava direcionada antes mesmo de ser buscada.
Postado por Alexandre Haubrich

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