A miséria do jornalismo brasileiro

O artigo a seguir é uma colaboração especial de Iván Marrom*
O presente artigo não deseja tornar-se um limitado amontoado de palavras a bradar contra as atrocidades do mercado jornalístico; tampouco contra as empresas responsáveis pela manutenção dessa barbaridade. Antes que cheguemos ao ápice do assunto, é conveniente ressaltar que o livro de título igual ao que encabeça este texto encarregar-se-á disso tudo – mesmo que o mercado não seja vilanizado pelo autor. A Miséria do Jornalismo Brasileiro, do atual colunista do Correio do Povo Juremir Machado da Silva, é uma ultrapassada, porém não por isso menos importante, obra de forte defesa de ideias acerca da grande mídia e sua crítica. Assim sendo, explicações mais aprofundadas sobre a enorme significância das mais de cento e cinquenta páginas não são necessárias ao leitor do Jornalismo B.
A crítica da mídia é uma bandeira extremamente válida e, mais do que isso, louvável. O jornalista crítico da mídia é, atualmente, o profissional da área que mais merece respeito e atenção. Normalmente oriunda de visões esquerdistas, por óbvio, a crítica também naufraga e comprova o uso do termo “miséria” que se encaixa à prática do jornalismo, porém. É algo que pode se assemelhar ao marxismo do movimento estudantil. Juremir, logo de início, define todo esse jogo como algo que cada vez surte menos efeito.
Isso é errado, mas trata-se de um escrito de meados de 2000, época em que a Internet todavia engatinhava e a era digital ainda não tinha se fixado. O autor acerta, entretanto, quando exclama da escassez de novos argumentos contra a grande mídia. Cito: “Os adversários dos desmandos da mídia, quase sempre com razão quanto ao conteúdo das suas reclamações, aniquilam o capital simbólico que possuem ao investir num modelo maniqueísta ou, na melhor das hipóteses, incompleto, herdado da Escola de Frankfurt”.
Quando comprei briga com o Jornal do Comércio, mesmo sendo eu o mero “guri do arquivo”, corria nas minhas veias não necessariamente um engajamento político propriamente dito, mas um sentimento de justiça e indignação. Doce ilusão a minha, em pensar que se podia fazer jornalismo mesmo acorrentado pelo poder econômico do dono das Lojas Tumelero. E é mais ou menos nessa linha que segue a obra de Juremir, com as devidas proporções seguramente guardadas, evidentemente. “Jornalista e aprendiz de cientista social, misturei os dois ramos e arranjei problemas nesses dois continentes”, diz.
Dividido em quarenta capítulos, sendo alguns discorrendo sobre casos específicos, Juremir Machado da Silva também esclarece o caso que o levou à demissão do jornal Zero Hora, devido ao imbróglio com o então colunista do periódico Luís Fernando Veríssimo. Brigar com a imprensa é o dilema que afeta todo o bom jornalista – aquele que pensa com a cabeça, e não somente com os dedos. Alguns loucos o fazem muito novos, recém formados ou ainda na faculdade, e logo sucumbem frente ao poderio asqueroso da grande mídia.
Outros, como Juremir, adentram os grandes jornais e mantêm-se, até chegar a um nível de reconhecimento capaz de dar mais visibilidade à análise de imprensa. O importante, acima de tudo, é andar na contramão – aprender a sobreviver sem perder-se na ética, virtude dispensável na prática jornalística.A Miséria do Jornalismo Brasileiro nos traz essa lei do mercado dos jornalões: reclamou, dançou. Duelar com a imprensa provoca exclusão. O pragmatismo barato assim determina: coitados dos que botam a boca no trombone.
Além de A Miséria do Jornalismo BrasileiroA Máquina Capitalista, de Pedrinho Guareschi e Roberto Ramos, e O Showrnalismo: a notícia como espetáculo, do exagerado José Arbex Jr., também são exemplos de livros feitos por quem por muitos anos se indignou com a falta de ética e democracia das grandes redações pelo Brasil. Tais obras jamais são oferecidas aos alunos de comunicação social, visto que a busca incessante pelo lucro começa também na faculdade. O próprio Juremir fala em três categorias básicas dos graduandos em jornalismo: o esquerdista ilustrado, o aluno-modelo aplicado e o idiota tecnológico. E não é que ele tem toda a razão? Também tem razão quando escreve que “esses tipos não correspondem plenamente a todos os indivíduos na sua órbita”, fazendo assim com que eu suspire de alívio não me encaixando em lugar nenhum. Ponto para aqueles que largam tudo de mão em busca de algo com mais decência, ou descambam para o estudo das ciências humanas, normalmente Ciências Sociais ou História.
Trabalhar na grande mídia não é um prêmio; montar uma agência de assessoria de imprensa também não. Que me desculpem os que aí se enquadram, mas jornalismo deve ser o que menos fazem. Que se indignem, sim, frente à crítica de mídia, tal como uma recém formada, minha colega no Jornal do Comércio, que prestou-se a escrever uma bíblia me criticando nos comentários de um artigo meu no Chapéu do Sol intitulado Economia do JC promove jornalismo em prol de meia dúzia. A indignação é boa, provoca gana e vontade de se mover, bradar suas ideias e defendê-las. Jornalista hoje em dia aprende na faculdade a não ter ideia. As duas fileiras da sala da economia do JC, com dez computadores cada, estavam sempre cheias de jornalistas que não davam um passo na rua pois faziam tudo por telefone. A miséria do jornalismo brasileiro.

* Iván é estudante de Ciências Sociais na UFRGS e Jornalismo na PUCRS, e (ir)responsável pelo blogue, por ora inativo, Chapéu do Sol.

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