Chega de migalhas!

Publicamos aqui o artigo do companheiro Henrique Maynardt, estudante do curso de Comunicação Social e membro do coletivo nacional Levante que expressa a luta da ocupação feita na reitoria da UFS. Um relato importante e que serve como exemplo do descaso do governo federal com um projeto de universidade socialmente referenciado e verdadeiramente democrático. Aos interessados, não deixem de visitar o blog da ocupação www.chegademigalhas.blogspot.com/ e vejam o vídeo que Henrique relata o sentido da ocupação abaixo…
 Nossa vitória não será por acidente!
 A ocupação da reitoria da UFS, a luta social e a lógica das migalhas.
 Por Henrique Maynart*
Na última semana a população sergipana, ao menos parte significativa, tomou conhecimento através da imprensa que na tarde do dia 30 de Maio, os estudantes de Comunicação Social da Universidade Federal de Sergipe decidiram ocupar o Gabinete do “Magnífico” Reitor da instituição, o professor Josué Modesto dos Passos Subrinho. Cansados de engolir os milhares de sapos, cobras e lagartos enviados há anos pela atual administração acadêmica, consolidados na ausência de respostas concretas para as deficiências estratosféricas presentes no curso, os estudantes ocupam as instalações da reitoria trazendo mensagem objetiva e singela: Chega de Migalhas!
 Há até quem pense que miolo de pão velho e biscoito de água e sal podem ser considerados artigos de luxo nos corredores da UFS. O curso de Comunicação Social da universidade vem constituindo um verdadeiro beco dos horrores nos últimos anos. Vejamos: Um curso que apresenta um déficit de 16 professores e que conta com média de 500 estudantes, que não comporta uma estrutura de laboratório e equipamentos suficientes, tanto em número quanto em qualidade, onde a construção do Complexo de Comunicação Social não há sequer prazo para início, um curso que não dispõe de autonomia para gerir os seus laboratórios não é exatamente um “paraíso”. Para engrossar o caldo desta sopa de esgoto, a UFS comporta uma Rádio Universitária que funciona como correia de transmissão da Assessoria de Comunicação da Universidade. Para quem conhece o Campus Aloísio Campos, em São Cristóvão, fica claro que até a localização da rádio reflete o seu estado de aproximação atual com a comunidade acadêmica, ou seja, quase nenhuma. Para quem não transita de carro pela universidade, chegar ao estúdio da rádio é uma verdadeira “via crucis”, complementada aos caminhos de terra e a temperatura insuportável, dá preguiça até de pensar. Sabe aquele prédio que fica depois que o vento faz a curva? Pois bem, é lá!
 Na programação de nossa surrada Rádio UFS 92.1 FM, o acesso à produção de conteúdo se resume a editais de poucos minutos (em uma rádio que tem 24 horas de programação) não há espaço para experimentação de produção dos estudantes, a participação popular e controle social. Isso sem falar no conselho administrativo da rádio, que é tão “democrático” e “equilibrado” que eu me recuso a cansar a pupila de quem for discorrendo sobre ele. Enfim, a Rádio UFS vem reproduzindo uma concepção de rádio, produção de conteúdo e da Comunicação em geral pautadas no mais do mesmo, do modelo comercial e excludente sob a hegemonia dos interesses da classe dominante.
 “Apois”, cansados de todo este quadro brutal- descrito acima como um verdadeiro muro das lamentações da UFS- e cansados do calhamaço retórico-burocrático apresentado pela administração da universidade, os estudantes pegaram o colchão, a escova de dentes, a indignação e se mudaram para o Gabinete do “Magnífico” Reitor Josué, e de lá não arredam o pé até que se apresentem soluções concretas e imediatas para a UFS. O MPF foi provocado para mediar o conflito e esperamos criar soluções de natureza legal e jurídica para o imbróglio. Contamos com a adesão de estudantes de Educação Física, História, Geografia, Direito, Fisioterapia, dentre outros estudantes que constroem a ocupação dia-dia e ombro a ombro com os estudantes de comunicação social.
 Para aqueles que duvidam da seriedade da ocupação, que acredita que ocupação é “coisa de vagabundo e desocupado”, nós estendemos o convite a todos os interessados em conhecer a nossa mobilização. Formamos comissões de estrutura, articulação, segurança e imprensa, limpamos a sala diariamente, respeitamos os demais servidores da UFS, construímos todas as ações de forma pacífica, planejamos e avaliamos nossas atividades madrugada a dentro  e mesmo assim estamos de pé às 6 da matina. Uma coisa eu adianto e garanto, estudante ocupado não é estudante parado!
 Mas quer dizer então que apenas os estudantes de comunicação da UFS estão cansados de migalhas? Mas de jeito nenhum! Por mais que toda luta e resistência abarque características específicas, nós não podemos tratar o contexto da luta de classes como uma concha de retalhos. Negar um curso, uma universidade e uma vida de migalhas é tarefa fundamental, é tarefa pra ontem, e tem muita gente cansada de migalhas por aí! Para além do curso de Comunicação Social, toda a UFS está cansada das migalhas em todos os cursos e centros, fruto da política de expansão ausente de qualidade incrementada pelo REUNI, dos cortes aferidos pelo governo Dilma na pasta da educação para o orçamento de 2011. Cansados de migalhas, os servidores técnicos administrativos recusaram a MP 520, que pretende transformar os Hospitais Universitários em Fundações de Direito Privado, implementando a lógica privatista em um serviço público. Para além da universidade, os professores da rede estadual também cansaram de migalhas e cruzaram os braços, na luta pela revisão do piso do magistério e pela manutenção da carreira. Cansados de migalhas, os jornalistas e radialistas sergipanos iniciam sua caminhada pela valorização salarial e por melhores condições de trabalho. É na negação das migalhas que os trabalhadores do setor de telecomunicações estão em greve há mais de trinta dias na Oi, que os policiais civis iniciam a sua mobilização. Os moradores do Santa Maria também não agüentam mais as migalhas direcionadas para a Zona de Expansão, e organizaram uma ocupação em frente à prefeitura da capital.
 Estamos todos no mesmo barco furado e não podemos naufragar em torno das migalhas da vida! Trabalhadores e estudantes precisam aglutinar um campo de luta e de resistência à política do pão seco e das velhas justificativas na educação, na saúde, na moradia popular, em todas as esferas de nossa sobrevivência. Seguimos ocupados na reitoria da UFS sem perder de vista os processos de luta em curso em Sergipe e no Brasil. A vitória de um será a vitória de todos, ela há de ser uma vitória concreta e alicerçada nos princípios da solidariedade e fraternidade. Uma vitória que não poderá chegar por acidente, por mais acidentados que estejam nossos caminhos!
 Henrique Maynart é comunicador popular, estudante de Jornalismo, militante do Partido Socialismo e Liberdade e “ocupado” na reitoria da UFS.

0 comentário(s):

Postar um comentário

Deixe sua sugestão, crítica ou saudação juntamente com seu contato.

 

© 2009-2012 movimento contestação