Serviços Públicos: um bom negócio!

24 de maio de 2011
Berna Menezes
Ao contrário do que diz a lenda, o governo Lula e agora o de Dilma seguem privatizando. Está em curso no país de forma acelerada uma Reforma Administrativa, no velho modelo neoliberal de Fernando Henrique, que reduz o papel do Estado, ataca direitos trabalhistas e abre às empresas privadas o filão bilionário dos serviços públicos.

Às 19 horas do dia 31 de dezembro de 2010, enquanto a maioria do povo brasileiro se preparava para a ceia de final de ano, o então Presidente Lula, em seu último dia de governo, assinava a MP520. Não era mais uma das inúmeras Medidas Provisórias – que se tornariam corriqueiras durante o seu governo e de seu antecessor FHC. O governo Lula levava para o nível federal uma reforma silenciosa e fatiada que já vinha ocorrendo em nível dos municípios e estados brasileiros: a Reforma Administrativa.
A MP520 desvinculou de uma só canetada 46 Hospitais Universitários em todo o país e os centralizou em uma Empresa Pública, de direito privado. Os trabalhadores desta empresa serão celetistas, terão um fundo de pensão e seu ingresso se dará por concurso “simplificado”. A empresa, ao contrário do que exige a Constituição Federal, não terá garantido o Controle Social. E, o modelo que lhe serviu de inspiração será o Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Portanto, a despeito da qualidade deste hospital, o que nos preocupa é que hoje os hospitais universitários são 100% SUS, enquanto o Clínicas já atende 10% através de planos privados de saúde. Estes hospitais são responsáveis por 90% dos procedimentos de alta complexidade do sistema de saúde do país. É neste filão que os planos de saúde estão de olho. 

Psol questiona constitucionalidade da MP 520
A MP 520 já foi motivo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por parte do PSOL, a ADI 4588. “Não resta dúvidas de que a competência para administrar unidades hospitalares é adstrita às unidades hospitalares vinculadas às instituições de ensino superior”, afirma a inicial. Nos termos do artigo 207 (que trata da Autonomia das Universidades), os hospitais universitários, defende o PSOL, se inserem no âmbito da pesquisa e extensão do ensino universitário, e, portanto, devem ser administrados pelas próprias universidades.
As inconstitucionalidades da MP 520 já haviam sido apontadas pelo Parecer minucioso do Dr. Rogério Coelho, que diz,  Examina, também, a medida do ponto de vista jurídico, concluindo que ela ofende a Constituição em vários pontos. Diz ainda, Trata-se, conforme o parecer, de princípio que não tem abrigo em nosso ordenamento constitucional e nem se encontra nele qualquer autorização para a delegação de serviços públicos básicos (como a saúde) para entes instrumentais com personalidade jurídica de direito privado. 

Um negócio que move bilhões
Mas os Hospitais Universitários não serão as únicas vítimas. Em janeiro deste ano, reuniram em Brasília, o Instituto de Desenvolvimento Gerencial, do empresário Jorge Gerdau e o Ministério da Saúde. Objetivo: apresentar um modelo de gestão do Estado, com critérios da iniciativa privada (meritocracia, regime celetistas, produtividade, etc). O primeiro órgão a aplicar o modelo será a Funasa. Os próximos setores seguiriam as prioridades do governo: saúde e educação.
Não é a primeira vez que Jorge Gerdau presta este tipo lucrativo de serviços a estados e municípios. Para se ter uma idéia, entre os estados que já prestou consultoria constam S.Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, etc. O negócio é tão grande que fez com que o empresário gaúcho, deixasse a presidência da siderúrgica da família para seu filho André, para seguir o que ele diz ser parte de uma “cruzada pessoal para levar conceitos de eficiência de gestão à esfera pública em todo o país”. O custo desta “cruzada” não é barato. Em média 3% do resultado obtido. Para se ter uma idéia, os cortes na Prefeitura de São Paulo em 2006, foram de 5,3 bilhões de reais, calculemos 3% sobre isso.
Não é à toa que esse negócio da China já chamou atenção do Ministério Público e do TCU. Em 2004 os ministros contestaram o trabalho do Movimento Brasil Competitivo (também de Gerdau), e em 2010 multaram os responsáveis técnicos. A ONG recebeu R$ 465 mil reais por “um singelo compêndio de informações genéricas, composto de inacreditáveis 4 páginas” segundo o Ministério Público que classificou o trabalho como superficial. Neste mesmo ano a ONG MBC, foi contratada sem licitação pelo Ministério do Planejamento, para fazer trabalhos de “otimização dos processos de gestão”, ao custo de R$1,5 milhão. No governo Lula, no total, o Instituto recebeu R$ 3,4 milhões, entre 2003 e 2010.
No governo Dilma Gerdau foi convidado a compor o Ministério, convite que recusou – provavelmente o salário não compensava . Agora foi confirmado para dirigir a Cãmara de Gestão e Planejamento,  com a tarefa de trazer ao serviço público os critérios de gestão do setor privado.

No Rio Grande do Sul não foi diferente
Bem, os gaúchos podem atestar os resultados da tal gestão competitiva. O famoso déficit zero do governo Yeda, assessorada pela ONG de Gerdau, significaram 4 anos sem reajustes para os professores, escolas de latas, fechamento de escolas, bibliotecas, laboratórios etc. No Rio de Janeiro, todo o setor de manutenção da frota da Polícia Militar foi terceirizado. Imaginem um estado dominado pelo narcotráfico, terceirizar um setor estratégico da Polícia Militar. 
Neste mês de abril, o governo Tarso, acaba de contratar a Fundação Getúlio Vargas, para cumprir a mesma tarefa. Controlar gastos, aumentar receita, reestruturar órgãos administrativos, etc. O governo gaúcho vai seguir a tendência dos gestores públicos do país de buscarem consultorias para imprimir nas suas administrações técnicas de gerenciamento consagradas no mundo das empresas privadas – como avaliações de recursos humanos, de resultados, de qualidade de produtos e de serviços (ZH 12.04.2011).
Paralelo a estas transformações, seguem através de Projetos de Lei, Medidas Provisórias, Decretos, um conjunto de medidas que conformam o que poderemos chamar de legalização do que já vem ocorrendo. Todos aprofundando a retirada de direitos do funcionalismo público. Entre eles está o PL 248 que acaba com a estabilidade do servidor público, a partir do qual tendo duas avaliações negativas o servidor poderá ser demitido. O PL que regulamenta os Fundos de Pensão, que a partir de um teto o servidor deverá contribuir para um fundo de pensão, se quiser manter a aposentadoria integral. Portanto, contribuiremos duas vezes, apesar de ter pago quase o dobro de um trabalhador celetista, durante toda a vida para obter aposentadoria integral . O PL 549 que congela por 10 anos os salários dos funcionários públicos federais. 

A resposta já começou
No dia 16 de fevereiro, ocorreu uma grande Marcha unificada do Funcionalismo Federal em Brasília, por aumento salarial e contra estas contra-reformas. No dia 13 deste mês, os federais, retornaram a Brasília em manifestação que conseguiu retirar da pauta o PL dos fundos de pensão. Ainda que todos saibam que o governo não vai recuar, é importante constatar que só com mobilização poderemos derrotar este conjunto de medidas. 
Em um Brasil que ostenta o triste título de estar entre os três países com maior desigualdade no mundo, a destruição dos serviços públicos já tão dilapidados pela ausência de verbas e políticas voltadas a atender dignamente o conjunto da população, é um escândalo. Principalmente para um povo que paga muito por estes serviços através de impostos.
Bernadete Menezes - Coordenadora Geral da ASSUFRGS e da Intersindical

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