“De que cor será sentir?”* – O caso da policial


por camillamaggo
Havia já rascunhado um post a respeito de pesquisa muito interessante que está no Gender Across Borders sobre a mãe que trabalha. Mudança de planos. Há poucas horas, nessa sexta a noite, esse vídeo foi postado na lista das blogueirasfeministas e no twitter e, inevitavelmente, o choque é geral. Então aí vão algumas palavras rápidas e cheias de revolta.
Para quem ainda não viu ou não teve estômago para ver (sim, as imagens não são agradáveis, para dizer o mínimo), um resumo. Uma ex-escrivã, suspeita de ato de corrupção, é interpelada por alguns colegas – um delegado e alguns agentes de polícia – alegando que deveria ser revistada. O absurdo começa aí. A mulher em questão não recusa a revista, apenas requer – direito seu, garantido pelo Código de Processo Penal – ser revistada por uma policial feminina. Não, não, apenas requer não: pede 20 vezes (em 12 minutos). Chora algumas vezes ao pedir. Grita algumas vezes ao pedir. E continua não se recusando à revista.
Na sala, vários agentes públicos. Duas delas são mulheres. Ela pede por várias vezes a ajuda de seu chefe. O desespero dela é explícito. Não, não é o desespero por ter “sido pega”… (a reportagem lança, ao final, uma suspeita a respeito disso, desse flagrante, o que talvez não venha ao caso) Ela não recusou a revista, lembre-se. Os gritos, o choro, os pedidos, revelam o desespero de uma mulher diante da violência iminente. E se isso ainda não te deu arrepios… talvez a ironia e o deboche de um deles ao dizer (ao menos assim me pareceu), ao dizer que então “vai ter que vir a Dra Maria Inês para revistá-la”, termine de fazer o serviço do horror.
Por que pintar todo esse quadro ao narrar a história? Primeiro de tudo, nada que esse texto possa dizer, chega perto da humilhação e do desespero retratados no vídeo. Mas há, sim, uma função nessa narração. Considerados todos esses aspectos do fato, como não dizer que uma ocorrência como essa só pode ser o resultado da pura e simples representação do machismo em mais uma estrutura social? Nada no caso pode justificar o tratamento dispensado a essa mulher, especialmente por agentes públicos – policiais -, constitucionalmente (ou assim supostamente) responsáveis pela proteção do cidadão e do exercício livre de seus direitos.
E se você ainda não se chocou o suficiente, pense que a Corregedoria considerou a referida situação “Correta e moderada”. Usar algemas em alguém que não se recusa a ser revistado, é moderação? Arrancar as roupas de uma mulher no meio de dez pessoas, homens e mulheres, é correto e moderado?
Onde a desobediência na conduta daquela que, vou dizer MAIS UMA VEZ, não se recusa ao ato do agente público, desde que praticado dentro da legalidade? - “Se você nao for revistada aqui, eu vou te prender por desobediência”. O que se fez da lei?  A ocorrência ultrapassa os limites do desrespeito à mulher, aos direitos humanos, à lei. Não há qualquer razão para o comportamento que ali se vê, a não ser o exercício de um poder que se sustenta na inferiorização e humilhação da mulher.
E não dá para fugir de uma pergunta: por que o silêncio e a omissão dos demais agentes? Das agentes mulheres?
Se a violência contra a mulher choca, se praticada por aqueles que deveriam protegê-la… Se a violência contra a mulher choca, se praticada diante daquelesque deveriam protegê-la… Se a violência contra a mulher choca, se praticada diante daquelas que poderiam protegê-la. A ação é grave. A omissão também. A ilegalidade absurda. A violência, essa não é preciso qualificar depois de tudo o que se viu.
O absurdo da situação, com licença poética, fala por si.

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