O caso de exploração de crianças e adolescentes indígenas em São Gabriel da Cachoeira,
no Amazonas, passou à esfera federal. Além da investigação aberta há
cerca de um mês a pedido do Ministério Público Federal, agora a
Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República e os
deputados federais da Comissão Parlamentar de Inquérito sobre Tráfico de
Pessoas passaram a acompanhar o caso. Na semana passada, a ministra Maria do Rosário visitou o centro de acolhida Kunhantãi Uka suri
(Casa da Menina Feliz), onde vítimas de abusos receberam apoio de
freiras salesianas. Os deputados, por sua vez, não só aprovaram
requerimento para uma diligência na cidade, como também a realização de
uma audiência pública para debater o problema.
A reportagem é publicada por Repórter Brasil, 27-11-2012.
As
primeiras denúncias da exploração foram feitas em 2008, mas nem o
Ministério Público Estadual, nem Polícia Civil, conseguiram desmantelar a
rede de pedofilia local. As violências cometidas ganharam repercussão
nacional neste mês, após notícias de que a virgindade de uma menina
havia sido vendida por R$ 20.
As autoridades ouviram depoimentos
de 12 garotas e listaram nove suspeitos. Quem acompanha a questão na
região alerta, no entanto, que a rede é bem maior. “Tem muito mais do
que os 12 casos. Há muitas meninas amedrontadas por essas pessoas,
meninas que se calam diante de ameaças”, diz o bispo Edson Taschetto Damian, que afirma que freiras da congregação que recebeu as vítimas vêm sofrendo ameaças e perseguição.
“Elas
estão em contato com essas meninas mais pobres e exploradas. Acabam
ouvindo e descobrindo os casos, que não são poucos. Os órgãos
judiciários locais estão pouco presentes. Embora tenha Tribunal de
Justiça e Procuradoria do Estado [em São Gabriel da Cachoeira], os
responsáveis vivem em Manaus e permanecem poucos dias na cidade”,
completa. De acordo com o religioso, a participação do procurador Júlio José Araújo Junior, do Ministério Público Federal, foi fundamental para que a investigação passasse ao âmbito federal.
Objeto sexual
“Por
que existe essa exploração? Porque para alguns brancos o índio é
objeto, não conta, não tem dignidade ou valor. Eles fazem o que bem
entendem”, diz o bispo Edson. O crescimento
populacional acelerado no município é apontado como um dos fatores que
agravaram a vulnerabilidade das meninas indígenas. O número de moradores
do município encravado na floresta, na fronteira do Brasil com
Venezuela e Colômbia, quase dobrou em duas décadas. De 23.140 pessoas em
1991, passou para 37.896 em 2010, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mais de 90% dos moradores são indígenas.
Em 2008, a eleição do prefeito Pedro Garcia (PT) e seu vice André Baniwa
(PV), primeiros índios a assumirem o poder municipal, acelerou a
urbanização. Muitas famílias trocaram aldeias pela cidade, esperançosas
em relação a acesso a mais políticas e serviços públicos. A desigualdade
social, no entanto, não mudou. Segundo os dados mais recentes do IBGE,
enquanto a renda média mensal dos indígenas é de R$ 601, a da população
de cor branca é de R$ 2.387.
A relação entre urbanização
acelerada em municípios indígenas e exploração sexual infantil não é
exclusividade do município no norte do Amazonas. Em julho do ano
passado, em encontro do Grupo de Estudos sobre Infância Indígena e Trabalho Infantil da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (Conaeti), integrantes manifestaram a preocupação em relação a este tema. Dernival dos Santos, representante dos índios Kiriris,
afirmou na ocasião que a saída de jovens das aldeias para as cidades
trazia riscos de exploração pela prostituição e alcoolismo.
Diante
da exposição das crianças indígenas ao risco de exploração sexual, os
integrantes apontaram a necessidade de estratégias prioritárias para
lidar com o problema.
Texto disponivel em IHU On Line
diversidade
Exploração sexual de adoslecentes indígenas
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