A Rede Globo e a criminalização internacional da pobreza


Há cerca de dois meses aconteceram na Inglaterra diversos protestos violentos de jovens retaliados pela sociedade inglesa. As manifestações aconteciam em um momento no qual boa parte da Europa começava a sentir a rebeldia popular contra as reduções nos gastos sociais levadas a cabo por governos que viam seus países prestes a quebrar. A retirada de direitos sociais foi determinada pelo FMI e, ao começar a ser implantada em países como a Grécia, a Espanha e a Inglaterra, foi motivo de amplas mobilizações. No caso específico inglês, a mídia brasileira usou a violência dos protestos para imediatamente criminalizar e tentar deslegitimar os manifestantes – chegando alguns jornalistas a discutir com entrevistados -, seguindo a política de boa parte da grande mídia internacional.
Já é fim de setembro e a poeira baixou, mas tremores cuja percepção é mais sutil continuam afetando a sociedade inglesa. O silêncio da mídia hegemônica brasileira, comprometida com o ideário neoliberal, apoiadora da retirada de direitos sociais, só é quebrado ocasionalmente, sempre com o propósito de mais criminalização, desembocando, irremediavelmente, em mau jornalismo.
Nesta segunda-feira o Jornal Hoje, da Rede Globo, veiculou uma reportagem de quase 3 minutos, feita por Cecília Malan, sobre o aumento, em Londres, das ocupações de mansões por jovens sem-teto. A matéria é uma repetição de preconceitos, desinformação e omissões. Já na “cabeça” (chamada do âncora para a matéria), há um lamento pelo “detalhe na legislação britânica que dificulta a expulsão de quem ocupa um imóvel ilegalmente” – entrar em um imóvel vazio, desde que não haja arrombamento, não é crime por lá.
Quando a voz da repórter entra em cena, é para alertar: “Casa vazia, desocupada? Cuidado, proprietário, tem gente de olho. São jovens sem-teto e pra lá de abusados”. E vem mais: “Não invadem qualquer casa, não. Escolhem a dedo mansões milionárias”. E mais: “E não é só chamar a polícia e botar todo mundo pra correr. Antes fosse possível”, lamenta Cecília Malan. As entrevistas são com o dono de uma propriedade invadida, com um agenciador de imóveis e com uma inquilina “com a única responsabilidade de evitar a entrada dos invasores, pagando aluguéis baixos”.
Nenhum “invasor” foi entrevistado. Em nenhum momento a repórter questiona o porquê do aumento das ocupações – e ela mesma se espanta: “Não é um fenômeno novo, mas está saindo do controle das autoridades britânicas” –, ou mesmo se pergunta quem são esses jovens.
Certamente a correspondente global não leu um texto do jornal A Verdade, ou qualquer texto entre tantos publicados em blogs ou veículos da mídia independente que trataram da situação sócio-econômica da Inglaterra. São 2,5 milhões de desempregados, 25% dos jovens ingleses está sem ter onde trabalhar há pelo menos 12 meses, 46% das pessoas com mais de 50 anos está na mesma situação. Até os suicídios tiveram considerável aumento no país, porque as ocupações de mansões desocupadas não iriam se multiplicar?

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