“O que me traz aqui foi uma declaração da Secretária Nacional de Direitos Humanos do Governo Federal. Ela fez uma declaração recente, fruto da violência do campo que, lamentavelmente, levou à morte mais um líder camponês do Brasil. E a Secretária Maria do Rosário fez uma fala carregada de honestidade, mas que nos preocupa. Ela disse: “Olha, a Secretaria Especial de Direitos Humanos não tem como proteger hoje as pessoas que estão ameaçadas. São 165 pessoas aproximadamente ameaçadas diretamente de morte e não temos condição de proteger sequer 30; não há estrutura para isso”. Ela foi sincera, mas não basta. E o debate que quero travar é que este não é um problema da Secretaria Especial de Direitos Humanos, porque a mídia colocou um debate que não é verdadeiro. O grande debate a ser feito é por que a violência no campo persiste ao longo de tantos anos e não porque a Secretaria Especial de Direitos Humanos tem ou não condição de proteger quem está ameaçado. É claro que isso também é importante. É claro que queremos programas de defesa dos defensores de direitos humanos, queremos programas do Governo que preservem as vidas, queremos tudo isso. Mas tem outro debate que uma parte grande dos meios de comunicação não quer fazer e nós queremos - o porquê, o que origina a violência no campo, o que leva essas pessoas à morte. Não são desavenças pessoais. Não são problemas particulares. É a luta pela terra. O que está levando essas pessoas à morte, mais uma vez, é a luta pela terra e, lamentavelmente, temos um país que não faz reforma agrária. A única divisão de terra que este país conheceu foi o estabelecimento das Capitanias Hereditárias, no século XVI. De lá para cá não se divide. São pontuais assentamentos. E não se tem a coragem de enfrentar o agro negócio. Não adianta! Quem diz que o Governo é para todo mundo está mentindo para alguém. Ou governa para o agronegócio, ou governa para quem tem trabalho escravo, ou governa para quem não tem terra, ou governa para o camponês. Tem que escolher. Tem que dizer de que lado está. É por isso que há violência no campo. É por isso que as pessoas estão morrendo. O problema não está especialmente ou unicamente na Secretaria Nacional de Direitos Humanos. Não. Lá existem problemas. Aliás, um dos problemas sabe qual é? O orçamento. É no orçamento que o Governo define para quem ele governa. Não é no discurso de campanha, não é no discurso do plenário. O Governo diz para quem ele governa quando define o orçamento. E aí, quero dizer o seguinte: números incontestáveis. Orçamento público atual do Governo Federal, R$678 bilhões para pagamento da dívida pública. Vou repetir: R$678 bilhões para pagamento da dívida pública. R$4,5 bilhões para o desenvolvimento agrário, e R$228 milhões para a Secretaria Especial de Direitos Humanos. Pronto. É aqui que sabemos para quem se governa. Governa-se para os banqueiros, se governa para quem vive dos juros, se governa para o agronegócio. Por que a PEC que define que o fazendeiro que tem trabalho escravo em suas terras vai ter sua terra expropriada? Por que não aprovamos essa PEC? Essa PEC não está fazendo reforma agrária, está condenando o trabalho escravo que já é crime. Por que não conseguimos aprovar no Congresso? Porque a bancada ruralista diz que não quer. Não quer por quê? Por que não quer combater o trabalho escravo? Só tem uma resposta. Porque se utiliza e porque enriquece através do trabalho escravo! Isso precisa ser dito, porque essa é a raiz da violência no campo. Lamentavelmente, a votação agora do Código Florestal alimenta a violência no campo. Vai morrer mais gente, vai morrer mais gente porque essa votação irresponsável do novo Código Florestal, projeto desse comunista transgênico, vai gerar mais violência no campo. Não tenham dúvida, porque fortalece o poder dos latifundiários, fortalece o poder do agronegócio. A que peso? Veja só que interessante: o agronegócio vende uma imagem de modernidade muito grande, de desenvolvimento, de algo importante para o Brasil. V.Exa. sabe que 80% dos empregos gerados no campo vêm da pequena agricultura? Não vêm do agronegócio; 80% dos empregos vêm da pequena agricultura; 85% da produção de alimentos no Brasil vêm da pequena agricultura. Então, fazer reforma agrária é uma proposta de justiça social, é fundamental. Estou falando de desenvolvimento, mas não estou falando de uma concepção de desenvolvimento que concentra renda, que concentra terra e que leva violência para o campo. Esse é o debate honesto que a gente tem que fazer. Este é um País do latifúndio há muito tempo. Quando falamos em latifúndio, lembramos da aula de História do Brasil Colônia. Mas, não é. Eu estou falando do Brasil agora. E o pior: o latifúndio, a escravidão e a dependência do mercado externo, características do nosso Brasil Colônia, são características de hoje da nossa República. Em 2009, o Rio de Janeiro foi Estado brasileiro com o maior número de trabalhadores escravos do Brasil. Não foi o Pará, foi o Rio! De acordo com dados oficiais, em 2009, o Rio de Janeiro foi o Estado que teve o maior número de casos de trabalhadores escravos do Brasil. O Rio, em 2009! O mesmo Rio do Eike Batista, do Porto do Açu, cujo projeto passa por uma das áreas de maior desenvolvimento agrário do Rio de Janeiro, de maior área de assentamento do Rio de Janeiro. Nos últimos três anos, o Governo Federal não desapropriou e assentou qualquer família no Rio de Janeiro. O Rio convive com o trabalho escravo. A combinação é essa: onde se alimenta o latifúndio se concebe a possibilidade do trabalho escravo. Essas coisas são como unha e carne. Não tem jeito. A História do Brasil une o latifúndio à escravidão. Enfrentar e defender a reforma agrária, colocar a reforma agrária na pauta do dia, é propor outra concepção de desenvolvimento, em que o Brasil não tenha o vergonhoso dado de que 1% dos proprietários de terra são donos de 44% do nosso território: 1% dos donos detém 44% das terras. Isso é completamente inadmissível. Esse desenvolvimento eu não quero. Outra perspectiva de desenvolvimento, com reforma agrária e com justiça é possível! Obrigado, Presidente. Quando dizemos que o Governo é para todo mundo, estamos mentindo para alguém. E nessa hora que vemos. Tenho muito apreço pela Ministra Maria do Rosário, muito respeito. Mas a pasta da Ministra tem R$228 milhões; o mesmo Governo gasta R$678 bilhões para pagar a dívida pública. É nessa hora que sabemos que a Ministra Maria do Rosário poderia fazer bem mais, se fosse prioridade para o Governo”. Marcelo Freixo em pronunciamento no plenário da Alerj no dia 2/6/11. http://www.marcelofreixo.com.br/site/noticias_do.php?codigo=296 |
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