UFRGS - Parque Tecnológico: o debate necessário

Prezados Colegas,

Sei que alguns de vocês acompanharam de perto o processo do Parque Tecnológico da UFRGS - até por que estavam diretamente envolvidos nas negociações - mas a verdade é que a maioria de nós recebeu pouca informação ao longo de 2009 e não tivemos oportunidade de discuti-lo minimamente. Essa responsabilidade era da Reitoria, que montou uma comissão para propor o projeto e deveria ter aberto a discussão diretamente com toda a comunidade universitária.

O projeto pode ser baixado e lido aqui (são 15 páginas), e o Regimento proposto - muito esclarecedor - está em anexo (foi encaminhado em um CD com outros materiais para as direções). A página da SEDETEC / UFRGS também traz informações relevantes a essa discussão, mas é na nova página do Parque da UFRGS que encontramos uma tentativa de responder a algumas críticas que só vieram a tona após a lamentável falta de diálogo protagonizada pela administração central em 5 de março passado.

Lendo o Projeto (e conhecendo o Regimento proposto) salta aos olhos que mais argumentos são dedicados a ressaltar o que a UFRGS tem a contribuir para as empresas que integrarão o Parque, do que para explicar o que as empresas têm a contribuir para a UFRGS. Assume-se
como natural que todos compreendam isso... Essa abordagem é no mínimo insuficiente.

Muito além do discurso doutrinário ou das evidências anedóticas típicas da "literatura de negócios", cabe a docentes de uma Universidade Pública fazer perguntas claras:

* Sabemos bem o que a UFRGS tem a oferecer, mas o que receberá de volta, e em que condições?
* É possível consumar-se a "troca" de conhecimentos (nossos) por investimentos (do setor empresarial) em termos (a) justos / equilibrados e (b) coerentes com as finalidades de uma Instituição Pública de Ensino Superior?
* O que significa exatamente a expressão "transferência de conhecimentos e/ou de tecnologia" e como a população em geral se beneficia disso?
* Qual o impacto da cultura "empreendedorista" e "competitivista" - já bastante difundida em certos setores da UFRGS - quando estiver implantada na escala física proposta?

Para entender essa proposta mais a fundo, convém saber um pouco mais acerca da origem desses movimentos pró Parques, por exemplo, lendo o relatório brasileiro da ANPROTEC / ABDI, (2009) disponível aqui, bem como conferindo o famoso Batelle / AURP Report de 2007. Um bom resumo dessas idéias pode ser achado no artigo principal da revista da CIETEC (janeiro de 2009), mas preparese para um texto bastante ideológico e em tom de propaganda (vejam a semelhança com o material existente na página do Parque). Uma análise mais cuidadosa aparece no artigo de Albert Link no livro publicado pela National Academy of Sciences sobre Parques (p.127 - este livro pode ser baixado gratuitamente aqui).

Notem que, apesar de minha posição crítica, estou provendo-lhes referências basicamente favoráveis à idéia de um "Parque Científico e Tecnológico", pois estou convencido de que qualquer de meus colegas, em lendo este material, perceberá a dimensão propagandística e, por
vezes, profundamente ingênua de toda essa concepção.
Res ipsa loquitur - ela fala por si só. Que cada um decida se é isso mesmo que queremos (e nesta escala) para nossa Universidade.

Ajuda tentar responder a algumas questões adicionais:

* Dá no mesmo incubar pequenas e médias empresas nacionais, que receber e servir a grandes conglomera dos internacionais, inclusive os monopolistas?
* É correto colaborarmos numa exagerada distribuição de recursos públicos para quem somente visa o lucro privado (e já recebe inúmeros benefícios do Estado)?
* É papel da Universidade Pública, que cumpre sua função estratégica da melhor forma possível para a construção do Brasil de amanhã, encarregar-se de emular o que seria uma Política Industrial Nacional (outrossim inexistente ou capenga) e instalar o "chão de fábrica" em suas próprias dependências, passando a "produzir"... bens e serviços? É essa a função de uma Universidade Pública?
* É função de uma Universidade Pública garantir emprego para alguns de seus egressos? Não seria para garantir de todos?

Muitas perguntas que não tiveram chance de ver a luz do dia.

Enfim, é verdade que estamos atrasados nesta discussão, mas antes tarde do que nunca, não é mesmo? Graças à ousadia e determinação de um grupo de estudantes, funcionários e cidadãos capazes de pensar por conta própria, conquistou-se, a duras (e desnecessárias) penas, a possi -
bilidade de pelo menos dois "Debates Públicas". Um será nesta terça (Campus do Vale), e o outro, no dia 31/03 (Campus Centro). Mais detalhes, acompanhe no blogue "Observatório do Parque" ou na página do Parque.

Esperemos que outros aportes a essa questão - até agora tratada como uma mera campanha de marqueting - sejam ouvidos e mesmo considerados na redação final a ser votada pelo CONSUN em 9 de abril. Precisaríamos de muito mais tempo, mas quem decide por nós acha que não.

De qualquer forma, vamos debater?

1o Debate Público:

Campus do Vale
Data: 23 de março (terça-feira)
Horário: 16h
Local: Auditório do Instituto de Informática

Saudações Universitárias,

Jorge A. Quillfeldt

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