O casamento gay e as mulheres hetero

Recapitulando: no dia 5 de maio, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a união estável para casais homoafetivos. No dia 28 de junho, o primeiro casal gay conseguiu converter a união estável em casamento. Então, esta semana a Câmara de Vereadores de São Paulo aprovou um projeto de lei que cria o Dia do Orgulho Hetero.

Casamento gay
Imagem do *Bloco, no Flickr em CC alguns direitos reservados.
É um daqueles casos em que a palavra “reacionário” cabe perfeitamente. O “orgulho hetero” é uma reação, uma tentativa de barrar a revolução que o movimento LGBT vem realizando nos costumes. Mas em uma coisa eu concordo com os conservadores: muitos acham que o casamento homoafetivo só afeta as lésbicas e gays que agora podem se casar; como os reacionários, eu acho que muda a sociedade e afeta a todos. A diferença é que eu acho que é mudança para melhor, para todos.
Não só eu. Existe uma grande afinidade entre os movimentos feminista e LGBT, porque ambos lidam com os preconceitos e discriminações decorrentes dos estereótipos de gênero. Umapesquisa do Ibope revelou que as mulheres estão menos incomodadas com a união gay que os homens (63% dos homens e 48% das mulheres são contra). Não vou entrar na questão do padrão de “masculinidade” (do machão-violento-“meu lance é mulher, tá me estranhando, pô”), mas lembrar que todos que não somos isso – inclusive muitos homens heterossexuais – estamos meio que no mesmo barco.
Nós tod@s questionamos e estamos transformando a própria ideia de casamento. O casamento como a união entre um homem e uma mulher, um homem que deve ser forte e provedor e uma mulher que deve ser submissa e dedicada ao lar, que tem como principal finalidade que esse casal gere filhos, está sob ameaça. As feministas fizeram e continuamos fazendo isso: queremos casamentos heterossexuais que sejam uma parceria, não um acordo em que o pai transfere a propriedade da mulher para o marido. E só mudando esse entendimento de casamento que o casamento gay faz sentido. Se é uma parceria em que ninguém é superior ao outro, por que não entre dois homens ou duas mulheres?
Um texto muito interessante da Slate – onde vi refletida muito da minha visão sobre o assunto – fala sobre o uso do argumento da desigualdade no casamento heterossexual, defendendo papéis pré-definidos para homens e mulheres:
O argumento naturalista de certa forma sofria com o fato de que as mulheres estavam vivendo fora de suas fronteiras naturais por décadas. Então os opositores ao casamento igualitário tiveram que passar para um tipo de projeto de felicidade – tentando mostrar que mulheres com atitudes tradicionais de gênero são mais felizes que as que estavam em relacionamentos igualitários.
Escrevendo contra o casamento homossexual no Washington Post em 1996, [o intelectual conservador William] Bennet opinou que ‘casamento não é uma construção arbitrária; é um estado honrado baseado na natureza diferente e complementar do homem e da mulher’ (itálicos da autora).
Claro que os casamentos homoafetivos não são, nem serão perfeitos, assim como os casamentos feministas. Não só porque todo casamento é único, é construção e aprendizado, e as falhas fazem parte; não só por isso, mas também porque essa nova ideia de casamento também é construção e aprendizado e não é simples nos livrarmos de um modelo que perdurou por tanto tempo e ainda hoje está aí. Não estou dizendo que casamento gay é automaticamente um casamento igualitário; mas só a ideia de casamento igualitário permite a possibilidade do casamento gay. É por isso que os conservadores estão tão preocupados; eles têm razão em estar. Estamos inventando um mundo novo.
Barbara Lopes

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