Mídia peruana assume abertamente a candidatura Fujimori e pune jornalistas que contrariam tal direcionamento
03/06/2011
Julia Nassif de Souza e Ignacio Lemus
de Lima (Peru)
Como nos tempos de Alberto Fujimori, grande parcela da mídia peruana adotou um perfil editorial claramente partidário, dignos de campanha política paga e, muitas vezes, deturpando a realidade dos fatos apresentados.
Em alguns casos, quem não acompanha esse perfil é perseguido ou dispensado, como aconteceu com a jornalista Patricia Montero, que depois de 12 anos exercendo a função de produtora no Canal N, pertencente ao grupo El Comercio, foi dispensada de sua função.
“Formalmente, não recebi uma única declaração que dissesse que eu estava defendendo Humala ou Keiko. Houve sinais internos do manejo editorial do grupo que nos davam esse indicativo, mas formalmente era porque entrava um novo diretor com sua nova equipe. Só que tudo isso aconteceu depois do primeiro turno eleitoral”, confirma ao Brasil de Fato Patricia Montero, que diz sempre ter atuado com liberdade dentro do veículo em que trabalhava.
E ela não foi a única. José Jara, também produtor do Canal N, foi outro dos que pagaram por tentar manter a imparcialidade na emissora que nasceu durante o governo Fujimori mas que teve um importante papel na sua queda, fazendo com que nos últimos anos fosse referência de credibilidade e pluralidade, relembra Patricia.
Além disso, nas últimas semanas membros da diretoria do jornal La Primera, que claramente apoiam Ollanta Humala, receberam mórbidos arranjos florais com seus nomes, atitude típica do Grupo Colina, ex-esquadrão da morte estatal de Fujimori, que ameaçava jornalistas e donos de meios.
Campanha explícita
A credibilidade de Keiko Fujimori ficou ainda mais fragilizada depois de ter sido declarada membro da diretoria do grupo El Comercio, responsável pelo Canal N e por outros meios de grande importância no Peru.
O que fica claro é que a campanha fujimorista nos meios de comunicação é fruto de pressão política, compra de apoios e troca de favores, dado que a maioria dos discursos, não somente na televisão, mas principalmente nos jornais, passaram a apoiar uma candidatura, modificaram suas equipes e suas linhas editorias e a realidade dos fatos. É o que analisa Rocío Silva Santisteban, secretária-executiva da Coordenadoria Nacional de Direitos Humanos do Peru.
“Os grandes meios no Peru estão apoiando muito abertamente a candidata Keiko Fujimori. Existem outros jornais que apoiam Ollanta Humala, mas com um número mínimo de leitores; os canais de televisão aberta estão em uma campanha muito agressiva contra Humala. Então, existe uma percepção do público de que os meios fazem campanha, são partidários e têm interesses econômicos escondidos vinculados com seus laços empresariais em outros segmentos”.
Santisteban declara ainda que vê difícil o futuro da defesa dos direitos humanos e a liberdade de imprensa no Peru, com um ou com outro candidato eleito. Segundo ela, os processos políticos no país terminaram gerando uma “autocensura”, tão transparente nos dias atuais, causada pelo medo dos proprietários dos meios, e, sobretudo, dos próprios jornalistas. “Alguns jornalistas não conseguem entender que são seus prestígios os que se perdem com essas autocensuras e que se afiliar à causa do meio em que trabalham de maneira servil é atentar contra o próprio jornalismo e contra si mesmos”.
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