por Felipe Corneau
Desde que a atual crise financeira cíclica deu as caras de forma mais contundente, lá por 2008, temos ouvido numerosos relatos sobre como a recessão e o desemprego assolam os países mais ricos do mundo. O desemprego europeu que foi considerado praticamente extinto na década de 1960 (quando beirava os 1%), passou a estacionar em patamares cada vez mais elevados, dificilmente caindo muito abaixo de 10% desde 2008.
Dentre aqueles que vem sofrendo com a crise, alguns países se destacam. Há tempos que ouvimos falar do quão grave era a crise na Grécia e dos cortes de seu governo, provocando (mesmo antes do levante árabe) grandes manifestações de massa e greves gerais que sacudiam Atenas (a ultima greve geral, aliás, foi ontem). A Irlanda, considerada antes o "Celtic Tiger" (pela suposta dinamia da sua economia), parece ter gastado mais de 30% de seu PIB somente com o resgate dos bancos, enquanto o desemprego assola o país e cortes na saúde e na previdência pagam a conta. Portugal não vai nada melhor, repetindo a receita de desemprego, déficit fiscal, contra-reformas e crise política.
E há, claro, a Espanha.
Se a persistência do alto desemprego na zona do Euro já faz o observador mais atento duvidar da estabilidade política a longo prazo nesses países, causa espanto quando se trata da Espanha - lá os desempregados são 20%, o dobro da média europeia. Entre os jovens de até 25 anos, mesmo incluindo aqueles com formação universitária, o desemprego chega aos assustadores 40%. E apesar disso, quase nada acontecia...
Até o dia 15 de maio.
foto por Julio Albarrán |
No domingo passado, uma semana antes das eleições municipais e regionais, um protesto levou cerca de 130 mil espanhóis às ruas por todo o país, numa luta contra o desemprego e os privilégios de políticos e banqueiros. Apesar da manifestação ter sido muito bem sucedida, não parecia haver planos para muito mais... até que algumas pessoas resolveram passar a noite em Puerta del Sol, praça no centro de Madrid. O site periodismohumano.com descreve da seguinte forma:
“Todo esto surge de una iniciativa espontánea de un grupo de personas que decidieron quedarse a dormir en la plaza después de una manifestación”, dice una voz desde la megafonía, que va emocionándose en su arenga recordando la génesis de lo que ya se percibe como un momento histórico. “¡Era tan fácil como eso! Que 40 personas se quedaran a dormir en la Puerta del Sol. Podría haberlo hecho yo, podrías haberlo hecho tú… Pero fueron ellas, y esas 40 personas han destapado todo esto”.
Já no dia seguinte, milhares ocupavam a praça. O movimento articulado inicialmente através das mídias sociais, principalmente pelos jovens, logo tomou as mídias tradicionais, engrossando ainda mais os seus números. Durante a semana muito mais praças foram ocupadas por toda a Espanha e agora além de Madrid, milhares passaram a se reunir em cidades como Valencia, Sevilla, Málaga e Barcelona.
foto por Axl Skywalker |
Muitos já dizem que a Praça Tahir atravessou o mediterrâneo, e agora vai tomar a Europa, pois assim como vimos recentemente no Egito e Tunísia, o movimento não responde à nenhum partido ou organização política tradicional. O movimento também não tem uma liderança centralizada e as reivindicações são as mais diversas. Exigem reformas políticas, o fim do arrocho social, direito à moradia e, é claro, mais empregos. Mais importante que isso, no entanto, é o sentimento demonstrado pelos "indignados" de que a sociedade espanhola deve tomar outro rumo - se preocupar menos com os lucros, e mais com as pessoas.
No que resultará isso ainda estamos por ver.
A despeito da justiça local, que decidiu proibir as manifestações no sábado e no domingo, devido às eleições de amanhã (22/05), as praças continuam cheias e os espíritos animados. Homens e mulheres de todas as idades - reunidos em Puerta del Sol e muitas outras praças pelo país - fazem desse sábado um verdadeiro "dia da reflexão". Mas ao contrário do que determinam os poderosos, não será um dia de silêncio e isolamento, mas de muito debate e agitação política.
http://www.circulosocialista.blog.br/2011/05/espanha-vai-as-ruas.html"Se não nos deixam sonhar, não os deixaremos dormir!"
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